Momento Espírita
Curitiba, 29 de Março de 2024
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ícone O leão irritado

Certa manhã, o rei leão acordou irritado.

Os animais, tomados de pânico, reuniram-se a fim de arranjar um modo de levar tranquilidade e calma ao soberano dos animais.

Tenho uma ideia, disse o camelo, o rei leão gosta de ouvir lendas e histórias. Se um de nós for à sua presença e lhe relatar um caso original e interessante, estou certo de que ele se acalmará e a bondade voltará ao seu coração.

Os animais acharam a ideia excelente, mas quem teria audácia suficiente para aproximar-se do rei?

A raposa apresentou-se, dizendo, de modo orgulhoso:

Se a melhora do rei depende do relato de uma história, então tudo está resolvido.

Conheço mais de trezentas histórias e fábulas interessantíssimas, que aprendi durante minhas longas viagens. Uma delas haverá de agradá-lo.

Os animais aclamaram a raposa, certos de que a questão estava solucionada e dirigiram-se ao palácio.

No meio do caminho, porém, a raposa parou repentinamente e, tremendo, disse aos companheiros:

Grande infortúnio acaba de atingir-me. Das trezentas histórias que eu tão bem sabia, esqueci-me de cem.

Os animais a tranquilizaram, afirmando que duzentas histórias seriam mais do que suficientes. E o cortejo novamente pôs-se em marcha.

Momentos depois, quando já se ouviam os urros do leão, a raposa parou novamente e disse:

Amigos, das duzentas histórias que eu sabia na ponta da língua, de cem eu não me lembro mais.

Desconfiados, os animais redarguiram que cem histórias bastariam para dissipar a agitação que tomara conta do soberano.

E dizendo isso, puseram-se novamente a caminho.

Quando o grupo chegava diante do palácio, a raposa teve um desmaio e rolou pelo chão.

Reanimada, reabriu os olhos e confessou trêmula:

Não me lembro das cem últimas histórias de que ainda há pouco me recordava.

Verdadeira desolação tomou conta dos animais.

E agora? Quem seria capaz, naquela grave emergência, de substituir a raposa?

O chacal, animal rude e inculto, disse conhecer uma única história muito original e que, por certo, agradaria o rei.

Animado pelos outros animais, ele galgou resoluto as longas escadarias do palácio, sumindo por trás de pesada porta.

Todos ficaram aguardando ansiosos o desfecho da arriscada tentativa.

Depois de longa espera, surgiu na larga varanda o leão, calmo e satisfeito.

Para espanto geral, atrás dele vinha o chacal, coberto de medalhas e com a cintura envolta pela faixa dourada de conselheiro do rei.

Que história maravilhosa teria ele contado ao soberano para merecer tamanha recompensa?

O camelo não resistiu à curiosidade e questionou o chacal que explicou, sorrindo:

Contei ao rei leão a peça que a vaidosa raposa nos pregara, e ele achou muita graça.

É sempre assim, explicou, longe do risco todos se inspiram e apresentam ideias geniais.

O verdadeiro talento e a verdadeira coragem, porém, só se revelam na ocasião exata e precisa, ao defrontarem o risco e a ameaça.

*   *   *

A verdadeira coragem consiste em enfrentar as dificuldades de modo honesto e franco, valendo-se de recursos lícitos e dignos para buscar superar os obstáculos que se apresentam.

Redação do Momento Espírita, com base
no livro
Contos e lendas orientais,
de Malba Tahan, ed. Nova Fronteira.
Em 30.7.2015.

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