Momento Espírita
Curitiba, 27 de Abril de 2024
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ícone O segredo da morte

Querido pai, hoje eu vi a morte chegar para você.

Seus braços, antes ternos e carinhosos, fecharam-se e a sensação do último abraço é o que cultivo em minha lembrança.

Seu sorriso, aquele que iluminava meu dia e abrandava meu coração, encerrou-se. Agora eu o guardo somente em minhas memórias, as quais nem sempre são suficientes nos dias de maior saudade.

Seus olhos, esmeraldas verdes, eu os vi se fecharem numa dormência profunda que não pude acordar com o meu costumeiro Bom dia.

Você soltou minha mão. Você partiu.

*   *   *

Querido filho, hoje nos reencontramos. Há alegria maior para um pai?

Há quanto tempo eu esperava pelo seu retorno às moradas celestes.

Nossos olhos, idênticos no verde da cor, embaçam-se pelas lágrimas que deixamos correr soltas.

Seus braços envolvem-me num profundo abraço e então sorrimos juntos, cúmplices na trama do amor que a morte não foi, não é e jamais será capaz de desatar.

Nossas vozes ecoam em uníssono para louvar e bendizer a Deus pela alegria do reencontro.

Quando nossos olhares sorriem um para o outro, quando nossas mãos se tocam, quando nossos corações pulsam no mesmo compasso, temos a certeza, absoluta certeza, de que por nenhum instante estivemos verdadeiramente separados.

*    *   *

Um poeta escreveu:

Quereis conhecer o segredo da morte.

Mas como podereis descobri-lo se não o procurardes no coração da vida?

A coruja, cujos olhos, feitos para a noite, são velados ao dia, não pode descortinar o mistério da luz.

Se quereis realmente contemplar o espírito da morte, abri amplamente as portas do vosso coração ao corpo da vida.

Pois a vida e a morte são uma e a mesma coisa, como o rio e o mar são uma e a mesma coisa.

Na profundeza de vossas esperanças e aspirações dorme vosso silencioso conhecimento do além.

E como sementes sonhando sob a neve, assim vosso coração sonha com a primavera.

Confiai nos sonhos, pois neles se ocultam as portas da eternidade.

Vosso temor da morte é semelhante ao temor do camponês quando comparece diante do rei, e este lhe estende a mão em sinal de consideração.

Não se regozija o camponês, apesar do seu temor, de receber as insígnias do rei?

Contudo, não está ele mais atento ao seu temor do que à distinção recebida?

Pois, que é morrer senão expor-se, desnudo, aos ventos e dissolver-se no sol?

E que é cessar de respirar senão libertar o hálito de suas marés agitadas, a fim de que se levante e se expanda e procure a Deus livremente?

É somente quando beberdes do rio do silêncio que podereis realmente cantar.

É somente quando atingirdes o cume da montanha que começareis a subir.

É quando a terra reivindicar vossos membros que podereis verdadeiramente dançar.

*   *   *

As duas esferas da existência são como uma ponte, que cruzamos de tempos em tempos. A morte, um adeus aparente, é apenas uma dentre tantas travessias.

Em ambos os planos, há constantes chegadas e despedidas.

Ao atravessarmos a ponte novamente, saibamos que, se por um lado deixaremos lágrimas de saudade, por outro encontraremos alegria pelo abraço há muito esperado.

Pensemos nisso!

Redação do Momento Espírita, com
 transcrição do cap.
A Morte, do livro
 
O Profeta, de Gibran Khalil Gibran,
 ed. ACIGI.
Em 2.11.2021.

 

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